segunda-feira, 4 de abril de 2011

Relatos do pós fim

Minha história não tem um começo feliz, até porque não me lembro dele. Não tive infância e nem sei quando nasci, deve ser aproximadamente quando tudo começou a existir. Sou bem diferente dos demais, não possuo medos e nem sonhos comuns, apenas algumas vontades inerentes de qualquer ser.

Comecei a trabalhar desde cedo e para um maior aperfeiçoamento, passei por algumas faculdades. Fiz psicologia e psiquiatria para melhor compreender as loucuras humanas. Teologia e história para conseguir responder os “porquês” da vida, porém esta tarefa não consegui concluir. Direito para ter consciência dos meus direitos e deveres, mas é incrível como ninguém tem o direito de morrer por livre e espontânea vontade, deixei este ramo de lado. Fui obrigada a fazer educação física, hoje com o grande aumento da obesidade, se não fico em forma não consigo labutar. Comecei a fazer Letras, Artes Cênicas, Marketing, estética e cheguei à conclusão de que não preciso fazer bonito para ninguém, no final querendo ou não é a mim que recorrem. Acham que gosto muito da minha profissão, entretanto, esquecem que nunca tiro férias, não recebo salário, nem vale transporte ou ticket refeição, nem ao menos sei quem é meu patrão. Minha jornada é de 24 horas e mal sobra tempo para bater um papo com meus pacientes. Antes que pensem que fiz Medicina, meu papel não é de salvar ninguém.

Como as pessoas de paz, também odeio as guerras e a falta de compaixão. Sempre sobra para mim e como já ficou bem claro, em períodos como esses de mais esforço braçal, não ganho nem hora extra. Aprendi com o tempo a ter paciência e a nunca questionar minha existência, até porque não tive a crise dos 15 anos e nem faço um tipo rebelde. Sou metida sim, os fatos me levam a crer que a cada dia que passa fico melhor que o resto. Nos meus momentos depressivos, gostaria muito de acabar, chegar ao fim, mas por ironia do destino, eu sou o fim. São poucos os que me temem e digo que é até mais fácil, assim me poupam esforços. Queria ser como todos, ter uma vida normal, casar, ter filhos, uma casinha e algumas margaridas no jardim. Mas como imortal, não devo ter esses prazeres.

Espero que leiam a minha história, que me entendam e que quando nos encontrarmos, possamos bater um bom papo, tomar uma cerveja e falar sobre política, antes de seguir para o descanso eterno.

Meu nome é Morte, não sei quando nasci e a única certeza que possuo é que sempre serei uma saída, sempre estarei presente, logo depois da vida, na sala de espera.

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